A vinda ao Brasil de Emmanuel Macron reacendeu críticas do agronegócio à políticas de mercado e exigências ambientais da França e da União Europeia ao Brasil, em especial às feitas ao setor dentro do chamado Green Deal do bloco.
Parlamentares da bancada ruralista veem uma boa janela de oportunidade para trazer à luz o debate sobre restrições impostas pela UE à importação de produtos do brasileiros, impulsionar um projeto de lei de reação a essas regras e tentar quebrar a resistência europeia aos biocombustíveis.
Eles citam o fato de que, enquanto a União Europeia aprovou uma resolução para proibir a venda de produtos de áreas de desmatamento, a França barrou as negociações comerciais do bloco com o Mercosul, ao mesmo tempo que o país cedeu à pressão da sua própria agropecuária e não ampliou suas leis de proteção ambiental.
Macron desembarcou no Brasil na terça-feira (26), primeiro no Pará, onde encontrou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Após passar por São Paulo nesta quarta (27), ele cumprirá agendas em Brasília nesta quinta (28), inclusive envolvendo o Congresso.
O senador Zequinha Marinho (PL-PA), por exemplo, afirmou que é “oportuna” a retomada dos debates sobre as restrições europeias no momento em que Macron vem ao país.
Ele defende a aprovação de um projeto de lei de sua autoria e que cria uma regra de reciprocidade ambiental, que determinaria que países que negociam com o Brasil teriam de ter regras ambientais tão rígidas quanto as daqui.
Membros da bancada ruralistas entendem que a proposta precisa ser aperfeiçoada, mas que é necessário que haja mais equivalência na relação entre os países.
“O acordo Mercosul-UE tem se arrastado por anos e, ultimamente, a coisa não tem avançado muito em razão de resistências do presidente Macron. Interessante que eles impõem uma série de restrições para importar os produtos brasileiros e pouco têm feito, de fato, para combater o aumento da temperatura do clima mundial”, afirma Marinho.
O senador lembra que recentemente a União Europeia evitou ampliar a área de preservação ambiental de suas fazendas de 4% para 7%, após protestos do setor agropecuário do velho continente.
Por isso, chama o discurso ambiental europeu de hipócrita e “meramente protecionista”.
“As nossas regras, que são cumpridas pelos produtores nacionais, terão de ser cumpridas também por aqueles que comercializarem seus produtos com o Brasil. O que vale para cá vai passar a valer para os nossos parceiros comerciais”, diz ele, sobre sua proposta.
A restrição de importações na União Europeia foi aprovada em abril de 2023, como parte do Green Deal do bloco.
A norma proíbe a venda em território europeu de uma série de produtos, caso tenham origem em áreas de desmatamento ilegal.
Países exportadores serão classificados com risco alto, médio ou baixo, nota que aumenta ou reduz o nível de rigidez e minúcia na fiscalização a seus itens.
Fazem parte dessa lista itens como carne, madeira, soja, café, cacau, borracha e dendê, além de seus derivados, por exemplo couro, chocolate, móveis, carvão vegetal, produtos de papel impresso, entre outros.
Os fornecedores que queiram vender seus produtos na Europa precisarão comprovar que seus produtos têm origem em áreas regulares, e estarão sujeitos à fiscalização de companhias europeias, que além do desmatamento também vão checar, por exemplo, se direito dos povos indígenas foram respeitados.
A regra passará a valer após dezembro deste ano, mas a revolta dos países fornecedores com a aprovação da lei fez com que a União Europeia decidisse não colocar a norma totalmente em prática já neste momento.
Segundo o jornal Financial Times, em vez de qualificar as nações nas três categorias de risco, todos serão mantidos, por ora, na classificação média.
Segundo um oficial europeu afirmou ao jornal, será necessário mais tempo para a implementação de um sistema confiável para o mecanismo funcionar plenamente.
Já o setor do agronegócio ligado aos biocombustíveis entende que essa pode ser uma oportunidade para diminuir a resistência da União Europeia ao produto, e também dos países que estão fora dela, no bloco chamado Efta.
O Brasil, assim como os Estados Unidos, são os principais potenciais produtores de biocombustíveis do mundo. Na Europa, no entanto, é difundido o argumento de que a produção do etanol pode atrapalhar a de alimentos, da qual o velho continente é um grande importador.
Além disso, membros do agronegócio brasileiro reclamam que foi a França que travou as negociações do acordo comercial entre União Europeia e Mercosul, e justamente sob argumentos de proteção ambiental.
Nesta quarta, o vice-presidente Geraldo Alckmin afirmou que cobraria de Macron a retomada das negociações e que os biocombustíveis precisam ser colocados na conversa.
“Eu estou indo para São Paulo, o presidente Macron está indo para São Paulo. Nós vamos ter um encontro na Fiesp [Federação da Indústria do Estado de São Paulo] e eu vou cobrar o acordo Mercosul-União Europeia”, disse, diante de membros da bancada ruralista.
Macron, após o encontro, disse que o acordo é “péssimo”, porque tem 20 anos de negociações e precisa ser reconstruído, levando em consideração as questões de clima, descarbonização e biodiversidade.