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Ensaio histórico se debruça sobre relação entre potências – 11/03/2024 – Mundo

Mesmo sem ter clara consciência, o mundo atravessa um momento de extremo perigo. Acredita ser “natural” o antagonismo entre a China e os Estados Unidos e não pensa nos efeitos de um confronto militar. A China é o mais recente agente de um longo processo de desafios sofridos pelo Ocidente.

É essa, em resumo, a tese do escritor e ensaísta franco-libanês Amin Maalouf. Ele se destacou pela primeira vez em 1983, ao publicar “As Cruzadas Vistas Pelos Árabes”, que mudou a historiografia daquele confronto entre cristãos e muçulmanos. Desde então, Maalouf publicou nove romances e sete ensaios históricos. O último, no ano passado, “O Labirinto dos Desgarrados”, acaba de ser traduzido pela editora Vestígio.

As 336 páginas de seu exaustivo ensaio não trazem informações inéditas. Mas alertam, segundo ele, para o desfecho de tensões que no passado existiram quando potências ocidentais, sobretudo o Reino Unido, foram desafiadas pela Rússia soviética, pelo Japão imperial e pela China, sobretudo depois da república proclamada em 1912 por Sun Yat-sem.

Vejamos o Japão, o único dos países estudados que está hoje fora do círculo de potenciais confrontos.

A mídia acordou para a força do arquipélago em maio de 1905, quando ele derrotou a frota imperial russa e afogou 5.000 oficiais e marinheiros que pretendiam, com arrogância, dar ao Japão uma demonstração de força.

Era algo inesperado porque, desde o século 16, os japoneses, que então enfrentaram a Coreia, não deixavam seu território para guerrear. Mas tudo mudou no século 20, com a conquista do território chinês da Manchúria e depois a guerra com os americanos no Pacífico, que terminou com as bombas atômicas de Hiroshima e Nagasaki.

Há bibliotecas inteiras sobre o imperialismo japonês no século passado. O país caçava matérias-primas e mão de obra fora de suas fronteiras. Praticava, na Ásia, um jogo idêntico ao que os europeus exerciam em solo africano. A ambição econômica andava de mãos dadas com a ambição militar. A imagem de um Japão tecnológico e pacifista é bem mais recente e data do pós-Guerra.

Vejamos agora a Rússia. Amin Maalouf se espanta com aquilo que ele não chega a chamar de autofagia do stalinismo. O país dos sovietes tinha tudo para se expandir com as turbinas de uma esquerda partidária e sindical que alardeava seus feitos pelo mundo. Mas escorregava nos expurgos políticos e processos em massa.

Vejamos o Komitern, que foi a internacional socialista a serviço de Moscou. Seus dois primeiros dirigentes, Grigori Zinoviev e Nikolai Bukarin, foram ambos destituídos, presos, torturados e fuzilados como “traidores”. Eram por coincidência judeus, o que, para Maalouf, reforça a reputação antissemita de Josef Stálin.

O intelectual franco-libanês também nota que o extermínio levava os comunistas não soviéticos a viverem em guetos marcados pelo medo. Com isso, não tinham espaço para o proselitismo em torno de um modelo de sociedade que, em tese, deveria ter crescido a partir de 1929, quando a quebra da Bolsa de Nova York atirou o capitalismo mundial na recessão.

E olhem que, para efeitos de propaganda, os russos tiveram nas décadas seguintes ampla supremacia tecnológica e militar. Lançaram em 1957 o Sputnik, primeiro satélite artificial, e tinham caças-bombardeiros mais rápidos e mais manobráveis que os americanos.

A China entra no livro por uma porta mais recente. É claro que há os nacionalistas de Chiang Kai-shek derrotados em 1949 pelos comunistas de Mao Tse-tung. E há o Grande Salto Adiante e a Revolução Cultural, dois desastres que custaram a morte pela fome de milhões de pessoas. Mas Maalouf sublinha o encontro entre os dirigentes russo e chinês, Vladimir Putin e Xi Jinping, há dois anos, pouco antes da invasão da Ucrânia.

O longo e instrutivo comunicado final evoca de modo cabotino a defesa dos modelos políticos que os dois dirigentes praticam. E criticam “certas potências” por tentarem impor suas ideias de democracia.

Pode ser, diz Maalouf, um aquecimento para algo muito mais sério que a reiteração de afinidades bilaterais. China e Rússia hoje se esbaldariam caso os Estados Unidos enfrentassem dificuldades.

Washington entra no livro como o representante atual daquele conjunto de países europeus que até a Segunda Guerra Mundial constituíam o Ocidente. Maalouf aborda a industrialização iniciada no século 19, depois da Guerra Civil, mas sua ênfase é posterior.

Ele acredita que o projeto intelectual de enriquecimento e expansão econômica veio com o pensamento academicamente moderno do presidente Woodrow Wilson (1913-1921), reitor da Universidade de Princeton e autor, antes de se eleger, de uma obra fundamental à época sobre a história política americana. Foi Wilson, diz o autor, que lançou as bases para fazer de seu país uma grande potência.

Fonte: Folha de São Paulo

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