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Maxwell Frost: Brasil fez mais que EUA para evitar golpe – 08/09/2023 – Mundo

Para o deputado americano Maxwell Frost, 26, o Brasil fez muito mais para evitar que o 8 de Janeiro se repetisse do que os Estados Unidos fizeram para prevenir um novo 6 de Janeiro.

O democrata integrou uma delegação de congressistas da ala à esquerda do partido que, liderada por Alexandria Ocasio-Cortez, visitou Brasil, Chile e Colômbia em agosto. O objetivo declarado da viagem, apoiada pelo Centro de Pesquisa Econômica e Política (CEPR, na sigla em inglês), era reformular as relações dos EUA com os países da América Latina e trocar experiências em três áreas: democracia, meio ambiente e paz.

Frost foi eleito no ano passado, aos 25 anos. De ascendência afro-cubana, ele é o deputado mais jovem do Congresso, e o primeiro representante da geração Z no Capitólio. Representa o 10º distrito da Flórida, que engloba Orlando. “É o lugar mais visitado do mundo pelos brasileiros. Acho que a Disney tem algo a ver com isso”, comenta, rindo.

A região é a mesma em que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) morou por cerca de três meses no início do ano, após a derrota para Lula (PT) nas eleições. Na época, Frost, junto a outros políticos americanos, defenderam que o brasileiro fosse enviado de volta ao país natal.

Caso Bolsonaro retorne à Flórida, o deputado americano diz que vai defender novamente sua saída dos EUA. “Não podemos afirmar ser um aliado próximo do Brasil e depois aceitar de bom grado um ex-presidente que inspirou uma insurreição e está tentando escapar da Justiça.”

Você conheceu muitos políticos brasileiros, principalmente da esquerda. Como você compara a esquerda no Brasil e nos EUA?

É um movimento global de busca por políticas progressistas que possam realmente ajudar a construir a economia de baixo para cima. Vimos muita solidariedade em torno disso. Viajar para o Brasil e entrar em um prédio do governo e ver as palavras “Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima” foi incrivelmente inspirador para nós.

Vejo muitas semelhanças, sendo a maior delas o fato de que agora, como progressistas, como democratas, como pessoas de esquerda, levantamos a bandeira de proteger a democracia. Isso é uma responsabilidade sagrada que agora pertence ao nosso movimento. É um momento emocionante e também assustador.

Por que assustador?

Porque estamos vendo esse crescimento do fascismo de direita em todo o mundo. E sabemos que os EUA têm um grande poder de influência. Vemos isso no Brasil. Vimos o que aconteceu em 8 de janeiro, e essa foi uma das conexões mais evidentes com a política dos EUA que observamos.

Sabemos que esse movimento global está sendo alimentado por pessoas dos EUA, como Steve Bannon [ex-estrategista de Donald Trump], que fez várias viagens ao Brasil. Por isso é assustador. Mas o que é bom é que a ampla maioria dos EUA rejeita o fascismo e quer a democracia. Por causa disso, temos uma mensagem vencedora.

Você vê Bolsonaro como uma consequência do que aconteceu nos EUA com Trump?

Acho que definitivamente ajudamos a influenciar isso e a influenciar o 8 de Janeiro. Claro que Trump não é o catalisador ou o início do fascismo. Ele é apenas um líder que influenciou muito e deu energia a esse movimento em todo o mundo. Bolsonaro é resultado disso, sim, Trump faz parte disso, mas também é resultado de um preconceito e ódio profundamente enraizados que correm nas veias de nossa política.

Nos EUA, Trump ainda é um candidato muito forte. No Brasil, Bolsonaro tornou-se inelegível. Ambos os países ainda enfrentam os mesmos desafios olhando para o futuro?

O Brasil fez muito mais do que nós para implementar políticas que evitem que isso aconteça novamente. Uma grande diferença é que nós nos reunimos com um dos comitês brasileiros no Legislativo encarregados de proteger a democracia. Nós não temos um comitê assim. Os comitês nos EUA, após o 6 de Janeiro, são todos baseados em responsabilização —o que é muito importante, mas nenhum deles é baseado em garantir que isso nunca aconteça novamente. Trump pode concorrer à Presidência, ele pode vencer. Não temos esses mecanismos em vigor tanto quanto o Brasil teve pós-insurreição.

Trouxemos muitas lições, e uma das coisas que vou fazer, uma vez que nós democratas voltarmos a ser maioria [na Câmara], é criar um comitê especial, não para responsabilizar [indivíduos] pela insurreição, mas para garantir que possamos aprovar políticas e projetos de lei que garantam que isso não aconteça novamente e que o fascismo não possa se infiltrar novamente em nosso governo.

Bolsonaro passou um tempo na Flórida após perder a eleição, e agora ele está enfrentando problemas legais no Brasil. Se ele voltar para a Flórida, o que pretende fazer?

Não há muito que eu possa fazer. Nós assinamos uma carta quando ele estava aqui dizendo que ele precisava voltar para o Brasil e enfrentar os desafios legais à sua frente. Dependendo de onde ele estivesse, pediríamos a mesma coisa. Se ele estiver tentando escapar dos danos que causou no Brasil, os EUA não devem ser um lugar de refúgio para um possível fugitivo de um país com o qual temos uma relação muito próxima. Orlando, na Flórida, é o lugar mais visitado do mundo inteiro pelos brasileiros.

Por que você acha que os brasileiros gostam tanto de Orlando?

Bem, acho que a Disney tem um pouco a ver com isso [risos]. Mas também a região central da Flórida é um lugar tão diverso e bonito. Mas não podemos afirmar ser um aliado próximo do Brasil e depois aceitar de bom grado um ex-presidente que inspirou uma insurreição. É nosso dever enviá-lo de volta.

O governador da Flórida, Ron DeSantis, usou brasileiros como exemplo de imigrantes que não deveriam vir para os EUA. Ao mesmo tempo, falando com brasileiros na Flórida, muitos aprovam DeSantis. Como você explica imigrantes apoiarem políticos que são contra a imigração?

Muitas vezes os imigrantes, especialmente os de países latinos, vêm para os EUA com grandes ambições porque somos um grande país onde existem oportunidades que não existem em outros lugares. E infelizmente, a direita muitas vezes usa as esperanças e sonhos de nossos imigrantes como arma.

Eu costumo brincar dizendo que muitos imigrantes de países latinos às vezes gostam de líderes autoritários porque pode ser que seja a isso com que estão acostumados, especialmente com a história de certos países. Eles não necessariamente querem isso. Eles querem democracia, mas gostam de um homem forte.

Líderes de direita se saem muito bem quando não precisam falar sobre políticas públicas, e podem se concentrar apenas em sua retórica. É uma linguagem autoritária e midiática que às vezes dá uma sensação familiar, especialmente com imigrantes, e eles [políticos autoritários] perceberam isso. É por isso que alguém como DeSantis conseguiu fazer com que muitos imigrantes que são impactados negativamente por suas políticas votem nele.

Mas os democratas também, por muito tempo, não fizeram um bom trabalho em se aproximar dos imigrantes e garantir que eles conheçam nossas políticas. E o fato é que, para os latinos, a imigração não é a principal questão. É importante e crucial, mas eles se importam com salários, com saúde, com violência armada. Eles se importam com suas liberdades.

Você visitou alguns movimentos organizados no Brasil, como a Cozinha Solidária do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto). Como você compara essas organizações com os movimentos nos EUA?

Uma das coisas mais inspiradoras de toda a viagem foi –e isso foi algo de última hora– a Marcha das Margaridas. Nós fomos para o “pré-marcha”, o “esquenta”. E tinha cerca de 40 mil pessoas! A energia realmente me animou, me soou familiar. Me lembrou do Black Lives Matter, dos protestos trabalhistas.

O que não era familiar era estar no palco, olhando para a minha direita, e ver oito ministros. Seria uma grande coisa um secretário [equivalente a ministro nos EUA] ir a um protesto. Acho que mostra uma ligação próxima entre este governo de esquerda e o movimento dos trabalhadores, que não vemos aqui.

A disputa entre Biden e Trump deve ser acirrada. Qual deve ser a estratégia democrata para convencer as pessoas a votar?

Geralmente, as campanhas são sobre o que vamos fazer, e às vezes cria-se uma expectativa falsa, e é por isso que tantas pessoas não votam. Mas se você apresentar sua agenda e disser que vamos fazer isso juntos, acho que então seremos capazes de construir um movimento que funcione para todos.

Devemos nos concentrar no que ele [Biden] fez, no que vamos fazer e, em seguida, encontrar as pessoas onde elas estão. Isso é algo pelo qual estou lutando: encontrar os jovens onde eles estão, não tentar criar um formato e convidá-los para ele. Às vezes você tem que ir à mesa das pessoas, às vezes elas não virão à sua. Quando falamos em ampliar o eleitorado e fazer com que mais pessoas votem, estamos falando das pessoas que não virão à nossa mesa. A pergunta é: como vamos até elas?


RAIO-X | MAXWELL FROST, 26

Deputado democrata eleito em 2022 pelo 10º distrito da Flórida. De ascendência afro-cubana, é o congressista mais jovem do Legislativo. Antes de entrar para a política, participou da ACLU (União Americana pelas Liberdades Civis), organização que defende o direito ao aborto e o de pessoas trans, entre outros, e da March for Our Lives (Marcha pelas Nossas Vidas), que defende uma legislação mais rigorosa contra armas no país. Atualmente, integra o Comitê de Supervisão e Prestação de Contas da Câmara.

Fonte: Folha de São Paulo

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