A China aumentará seus gastos com defesa em 7,2% este ano, alimentando um orçamento militar que mais do que dobrou nos 11 anos de Xi Jinping no cargo, à medida que Pequim endurece sua postura em relação a Taiwan, de acordo com relatórios oficiais divulgados nesta terça-feira (5).
O aumento reflete a elevação da taxa apresentada no orçamento do ano passado e novamente fica acima da previsão do governo de crescimento econômico para 2024, na casa dos 5%.
A China também adotou oficialmente uma linguagem mais dura contra Taiwan ao divulgar os números para o orçamento do ano, eliminando a menção à “reunificação pacífica” em relatório do governo apresentado pelo primeiro-ministro Li Qiang na abertura do Congresso Nacional do Povo (NPC), o Parlamento da China, na terça.
As tensões aumentaram nos últimos anos em relação a Taiwan, a ilha que a China considera uma província rebelde e parte de seu território, e em outras partes do Leste da Ásia.
Li Mingjiang, estudioso de defesa da Escola de Estudos Internacionais Rajaratnam (RSIS) em Singapura, diz que, apesar da economia em dificuldades da China, Taiwan é um peso importante nos gastos com defesa de Pequim.
“A China está mostrando que na próxima década deseja expandir seu poder militar ao ponto de estar preparada para vencer uma guerra se não tiver escolha a não ser lutar”, afirma Li.
Desde que Xi se tornou o líder do país há mais de uma década, o orçamento de defesa aumentou para 1,67 trilhão de yuans (US$ 230 bilhões, R$ 1,13 trilhão) este ano, ante 720 bilhões de yuans em 2013. O aumento percentual nos gastos militares tem superado consistentemente a meta anual de crescimento econômico durante seu período à frente do país.
O orçamento de defesa é observado de perto pelos vizinhos da China e pelos Estados Unidos, atentos às intenções estratégicas de Pequim e ao desenvolvimento de suas forças armadas.
Com base em dados do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS), com sede em Londres, o orçamento deste ano marca o trigésimo ano consecutivo de aumentos nos gastos com defesa da China.
Na terça, o porta-voz do governo japonês, Yoshimasa Hayashi, pediu maior transparência de Pequim com relação a esses gastos. Os contínuos aumentos nas despesas militares da China sem transparência suficiente representam “o maior desafio estratégico de todos os tempos para garantir a paz e estabilidade do Japão e da comunidade internacional e fortalecer a ordem internacional”, afirmou Hayashi, em Tóquio.
O Ministério da Defesa da Coreia do Sul e o da Austrália não comentaram a divulgação de aumento de gastos militares por Pequim.
James Char, estudioso de segurança do RSIS, de Singapura, diz que, apesar de as despesas com defesa superarem o crescimento do PIB, elas permanecem em cerca de 1,3% do PIB total na última década e não têm sobrecarregado os cofres nacionais. “Claro, o destino econômico de longo prazo da China determinará se isso pode ser sustentado no futuro”, afirma Char.
A compra de novos equipamentos provavelmente consumirá a maior parte do orçamento, em meio ao objetivo do Exército de modernização proposto por Xi até 2035, segundo pesquisa do IISS publicada no mês passado.
Esse esforço continua em várias frentes, com a China produzindo armas que vão de navios de guerra e submarinos a drones e mísseis avançados que podem ser equipados com ogivas nucleares e convencionais.
De acordo com Char, um gerenciamento mais rigoroso também será uma prioridade para a liderança militar após expurgos de funcionários de alto escalão relacionadas à aquisição de armas.
A Comissão Militar Central, o principal órgão militar da China, ordenou em julho passado uma “limpeza” do processo de compras militares após identificar irregularidades. A comissão não anunciou os resultados da investigação que fez, mas pelo menos nove generais, incluindo quatro diretamente responsáveis por compras militares, foram destituídos de seus títulos de parlamentares, um procedimento necessário antes que possam ser acusados em tribunal.
Dois ex-ministros da Defesa, Li Shangfu e Wei Fenghe, também desapareceram da vida pública sem explicação, o que na China com frequência significa que estão sob investigação.
No relatório de trabalho do governo, a China reiterou um apelo à “reunificação” com Taiwan, mas enfatizou que deseja “ser firme” ao fazê-lo e eliminou o termo “pacífica”, usado até então em relatórios anteriores.
Embora não seja a primeira vez que a China tenha omitido a expressão, a mudança na linguagem é observada de perto como um possível sinal de uma postura mais assertiva em relação a Taiwan.
O Conselho de Assuntos do Continente de Taiwan pediu à China na terça que aceitasse o fato de que os dois lados não são subordinados um ao outro e instou a China a criar intercâmbios saudáveis através do estreito que separa a ilha do continente. O ministro da Defesa da ilha havia dito na terça que as forças armadas de Taiwan aumentariam o número de exercícios militares com mísseis neste ano.
Wen-Ti Sung, cientista político e membro do Atlantic Council, afirma que a linguagem sobre Taiwan “se endureceu moderadamente”. “Pequim parece estar se equilibrando entre projetar maior firmeza em relação a Taiwan e estabilizar as relações com os amigos internacionais da ilha”, diz.
Depois da vitória de Lai Ching-te, do Partido Democrático Progressista, nas eleições presidenciais em Taiwan, o quarto líder do Partido Comunista Chinês, Wang Huning, afirmou em uma reunião de alto nível sobre política de Taiwan no mês passado que a China “combaterá resolutamente” quaisquer esforços em direção à independência de Taiwan este ano —Lai era o mais favorável à independência de Taiwan entre os candidatos.