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A morte do bilionário Zong Qinghou, com 79 anos, um dos homens mais ricos da China, repercutiu no país e expôs o fim de uma era nos negócios do gigante asiático. O magnata do ramo de bebidas Zong estava com uma doença não divulgada pela família e deixou uma herdeira.
O bilionário começou seu império no setor de refrigerantes vendendo bebidas em um triciclo, que ele estacionava em frente a escolas e comercializava bebidas engarrafas, água, picolé e mingau enlatado. Durante a abertura chinesa, seu pequeno negócio cresceu significativamente.
- Ele batizou o conglomerado de Wahaha (uma brincadeira com a palavra chinesa para criança risonha) e fez fortuna ao firmar parceria com a Danone;
- Desavenças comerciais levaram-o a disputar na Justiça contra o grupo francês o controle da sua empresa, em um processo que venceu e lhe rendeu mais de US$ 8 bi.
Zong sempre foi exaltado por nunca perder o jeito humilde. Entre os pares, ganhou fama por tentar viver com menos de US$ 6 mil por ano (cerca de R$ 30 mil).
Sua figura modesta e apta ao sucesso serviu de modelo para as reformas empreendidas por Deng Xiaoping e seus sucessores, que advogavam pelo chamado 韬光养晦 (tao guang yang hui, expressão idiomática que pode ser vagamente traduzida como “não chame a atenção e aguarde a hora certa de agir”).
A morte foi lamentada por várias figuras políticas e empresariais na China. O grupo Wahaha agora deve passar para as mãos da herdeira Zong Fuli, que vinha sendo preparada para o posto há alguns anos.
Por que importa: admirado por seus compatriotas, Zong era uma relíquia de uma China que aos poucos vai ficando para trás. Seus valores de modéstia e trabalho árduo, embora essenciais na fase de abertura, hoje dificilmente conseguiriam prosperar no clima político atual.
Não por acaso, muitos acadêmicos hoje reconhecem que o lema “tao guang yang hui”, que serviu de norte para muitos destes “primeiros ricos” da China, foi substituído por 奋发有为 (Fen Fa You Wei), lema da era Xi que pode ser traduzida como “aspire o sucesso” ou “seja promissor”.
pare para ver
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o que também importa
★ Dois famosos blogueiros chineses no exílio denunciaram que a polícia do país estaria assediando alguns dos seus milhões de seguidores em plataformas internacionais de mídia social. Wang Zhi’an, que trabalhou na emissora estatal CCTV, e o artista Li Ying, ambos conhecidos por postar notícias chinesas não censuradas, afirmaram no domingo (25) que a polícia estava interrogando pessoas que os seguiam nas redes sociais. Eles instaram os seguidores a tomar precauções, como deixar de seguir suas contas, alterar seus nomes de usuário, evitar telefones fabricados na China e se preparar para serem questionados. Plataformas como X (ex-Twitter), YouTube e Instagram são bloqueadas na China, mas muitos internautas driblam a censura facilmente usando um serviço de VPN.
★ O caso extraconjugal de professora e um estudante de 16 anos “bombou” nas redes sociais. Segundo o relato de um homem identificado apenas como Wu, sua esposa Zhang Yue trabalhava há vários anos como professora de uma escola secundária em Xangai. Na semana passada, porém, Wu encontrou mensagens no WeChat dela (aplicativo semelhante ao WhatsApp) em que Zhang combinava encontros secretos com o amante Lei Rui, um aluno de 16 anos. O marido expôs os prints em um vídeo que alcançou mais de 3 bilhões de visualizações em menos de 24 horas. Após a repercussão, a escola anunciou a suspensão imediata da professora. A lei chinesa permite relações sexuais consensuais a partir dos 14 anos de idade.
★ O Ministério do Comércio Chinês criticou os Estados Unidos por impor sanções unilaterais à Rússia. As novas sanções proíbem empresas de comercializarem produtos americanos com 93 entidades da Rússia, China, Turquia, Emirados Árabes Unidos, Quirguistão, Índia e Coreia do Sul, todas acusadas de apoiar logisticamente a invasão russa à Ucrânia. O ministério chinês disse que a lista, na qual são citadas oito companhias da China, afeta os direitos e interesses legítimos das empresas chinesas, e que “tomará todas as medidas necessárias para protegê-las”. Washington não reagiu ao posicionamento.
fique de olho
A China anunciou na semana passada que voltará a enviar pandas para os EUA. A novidade foi compartilhada pela porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Mao Ning, que durante coletiva de imprensa confirmou o envio dos animais ao zoológico de San Diego. Madri, na Espanha, também receberá animais.
- Não há informações de quando os ursos chegarão aos EUA, mas o empréstimo tinha sido sinalizado por Xi Jinping na visita à Califórnia para o encontro da APEC em 2023;
- Washington foi a primeira cidade dos EUA a receber pandas da China, mas foi obrigada a dizer adeus aos seus últimos exemplares em 2023, quando Pequim se recusou a renovar o contrato com o zoológico local.
Por que importa: todos os pandas do mundo pertencem legalmente à China, que os empresta em contratos que duram de alguns meses a vários anos. A prática, conhecida como “diplomacia do panda” começou quando o então premiê chinês Zhou Enlai ofereceu um exemplar a Pat Nixon durante a visita do presidente Richard Nixon à China.
Desde então, o oferecimento de pandas passou a ser o sinal mais aparente de amizade entre a China e outros países. Com a deterioração das relações com os EUA, Pequim pediu de volta os animais em Washington e se preparava para tomar os últimos pandas em território americano, que estão em Atlanta, Geórgia. A sinalização de que novos ursos serão emprestados pode ser interpretado como sinal de otimismo em Pequim com os rumos dos laços bilaterais.
para ir a fundo
- O Centro de Estudos Estratégicos Internacionais (CSIS) produziu um abrangente relatório em que relaciona o crescimento da influência chinesa com a regressão da democracia na América Latina. O texto e uma conversa com o pesquisador que liderou a pesquisa podem ser encontrados aqui. (gratuito, em inglês)
- O Instituto Confúcio da Unesp segue com matrículas abertas para cursos de chinês. A instituição oferece todos os níveis, em regime presencial ou on-line. Informações aqui (pago, em português).