Israel voltou a bombardear a Faixa de Gaza nesta terça-feira (20), horas antes de uma votação no Conselho de Segurança da ONU na qual a comunidade internacional tenta aprovar uma nova trégua no conflito que devasta o território palestino há mais de quatro meses.
Testemunhas relataram bombardeios e combates ainda nas primeiras horas do dia em quase todo o território. Foram relatados ataques no leste da Cidade de Gaza, ao norte, em Khan Yunis, ao sul, e também em regiões centrais.
“Os mísseis caem sobre nós”, disse Aiman Abu Shamali, palestino que perdeu a mulher e a filha em um ataque em Zawaida, no centro do território. “No norte, as pessoas morrem de fome. Nós, aqui, morremos nos bombardeios.”
As ofensivas ocorrem no momento em que Israel está sob intensa pressão internacional por preparar uma operação militar em larga escala em Rafah. Localizada na região da fronteira com o Egito, a cidade palestina abriga hoje cerca de metade dos 2,4 milhões de habitantes de Gaza, forçados a se deslocar para o sul da Faixa durante a guerra.
Três agências da ONU divulgaram um alerta sobre a situação humanitária em Gaza que aponta para a escassez de alimentos e a propagação de doenças. Tais fatores, segundo as organizações, podem provocar uma “explosão” no número de mortes de crianças.
Em um momento de grande escrutínio global em relação às ações de Israel em Gaza, o Conselho de Segurança da ONU deverá votar, ainda nesta terça, uma resolução para cessar-fogo, apresentada pela Argélia, na qual o governo dos Estados Unidos, principal aliado de Israel, ameaçou vetar.
O texto, obtido pela agência de notícias AFP, exige “um cessar-fogo humanitário imediato que deve ser respeitado por todas as partes” e se opõe “ao deslocamento forçado da população civil palestina”, em referência à saída de civis exigida por Israel antes da ofensiva contra Rafah.
Washington considera que a resolução dificulta as negociações para obter uma nova trégua que também inclua a libertação dos reféns capturados pelo Hamas no ataque contra o sul de Israel, em 7 de outubro.
O ataque deixou cerca de 1.200 mortos, a maioria civis. O grupo terrorista também sequestrou cerca de 250 pessoas, das quais 130 permanecem como reféns em Gaza, incluindo 30 que teriam morrido nos cativeiros.
A ofensiva militar israelense em Gaza para “aniquilar” o Hamas deixou pelo menos 29.092 mortos, a maioria mulheres, adolescentes e crianças, segundo o Ministério da Saúde do território, controlado pelo Hamas.
O governo dos Estados Unidos apresentou ao Conselho de Segurança um texto alternativo à proposta da Argélia, na qual enfatiza o “apoio a um cessar-fogo temporário em Gaza”, segundo um rascunho ao qual a AFP também teve acesso. O texto ainda alerta que uma ofensiva terrestre em Rafah “provocará mais danos aos civis” e mais deslocamentos.
A cidade de Rafah é crucial porque é o principal ponto de entrada da ajuda humanitária da qual depende a população palestina, que está sob cerco total de Israel desde outubro. Os ataques israelenses na cidade impedem as operações humanitárias, e a entrega de alimentos é bloqueada com frequência, segundo a UNRWA, a agência da ONU para os refugiados palestinos.
Uma em cada seis crianças no norte de Gaza sofre desnutrição aguda, segundo o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), numa situação que, segundo a organização, pode agravar o “nível insuportável de mortes de crianças”.
Benny Gantz, membro do gabinete de guerra em Israel, alertou no domingo (18) que se os reféns não forem devolvidos até o Ramadã, “os combates continuarão em todas as partes, inclusive na área de Rafah”. O mês sagrado muçulmano começa em 10 de março.
Os mediadores internacionais tentam evitar o ataque contra Rafah, mas os representantes de negociações conduzidas por Estados Unidos, Egito e Qatar não alcançaram um acordo. O Hamas ameaçou abandonar os diálogos caso mais ajuda não seja enviada. Já o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, rejeitou as exigências do movimento palestino.
Manifestantes israelenses tentaram bloquear o acesso dos caminhões de ajuda à fronteira entre Egito e Gaza para pressionar pela libertação dos reféns.
Um grupo de especialistas da ONU pediu uma investigação independente dos supostos abusos israelenses contra mulheres e crianças palestinas, incluindo assassinatos, estupros e agressões sexuais. Israel classificou as acusações como “vis e sem fundamento”.