Depois de dois dias de pânico e reclusão, o Equador tenta voltar ao normal ainda com um pé atrás nesta quinta-feira (11). Os militares que eram vistos fazendo revistas com frequência diante da declaração de “conflito armado interno” pelo presidente Daniel Noboa agora são mais raros pelas ruas de Guayaquil.
Foi nessa cidade portuária, um dos epicentros da crise de segurança vivida pelo país sul-americano nos últimos três anos, que um grupo de homens encapuzados invadiu o canal TC Televisão e fez funcionários reféns ao vivo na última terça (9), em ação que terminou com 13 homens presos.
Em frente ao prédio, policiais nacionais se revezam em plantões dentro de um furgão desde aquela tarde que espalhou caos pelo país, enquanto os poucos trabalhadores que chegam ao edifício dizem ter sido orientados a não falar por segurança, já que as investigações estão em curso.
A poucos quilômetros dali, as avenidas que antes ficavam repletas de estudantes no entorno da Universidade de Guayaquil seguem desertas, com as aulas presenciais suspensas pelo menos até o fim da semana. Um vídeo de pessoas fugindo do campus fez muitos pensarem até hoje que houve um atentado ali.
“Na verdade as pessoas se informaram pelas redes sociais e entraram em pânico, mas quando entramos não encontramos nada”, diz o segurança privado que se aproxima desconfiado com a chegada da reportagem.
Informações de ameaças de bombas e atentados continuam circulando —parte delas desmentida pela Polícia Nacional, e parte confirmada— como um incêndio a uma boate na cidade El Coca, na região leste, que deixou dois mortos e nove feridos.
Um dos únicos pontos em que os militares ainda são vistos em Guayaquil é em frente à casa da família do presidente, na região turística conhecida como Malecón, onde dois agentes elogiam os poderes concedidos por Noboa às Forças Armadas.
“Agora a ordem é aniquilar os terroristas”, respondem ao serem questionados sobre o que mudou, apenas com os olhos de fora por segurança pessoal, dizem. Questionados se já se sentiram em perigo, um deles diz que “a todo momento”. “Somos de uma região complicada, perto da fronteira com o Peru, mas hoje qualquer lugar está ruim”, afirma.
Na traseira de um caminhão, o grupo recebe rosquinhas e refrigerante de voluntários que foram agradecer pelo trabalho. Cenas parecidas se espalharam pelo país, com entidades como o Comitê Empresarial Equatoriano e a Câmara Nacional de Aquicultura incentivando que empresas doem kits aos agentes.
“Obrigada pelo apoio de vocês”, agradeceu um militar. “Obrigada a vocês por cuidar da gente”, respondeu Belen Elizalde, 29, que saiu junto com os funcionários do seu restaurante Korea Chicken pela segunda vez. Na noite de quarta (10), entregaram frango com batatas, o prato forte da casa.
“Foram dias bastante difíceis para todos”, diz ela. “Estamos ajudando um pouco assim como eles estão dando parte deles, deixando suas famílias para cuidar da gente e tirar o nosso país desse grande problema da insegurança que estamos vivendo.”
Nos centros comerciais, as lojas começam a abrir, mas nem todas. “Ontem [quarta] ninguém veio. Hoje alguns ainda estão fechados, esperando um dia ou dois para ver o que vai acontecer”, diz Noemi Alvarez, 21, em frente ao seu estande de roupas, coleiras e ossos para cachorros.
Perto dali, a funcionária de um quiosque de sorvetes que não quis dizer o nome também relata um movimento ainda fraco. Ela conta ter se trancado sozinha no lugar ao ver todo mundo passar correndo e chorando na terça-feira. Depois, esperou por duas horas dentro de um comércio para voltar para casa.
Vendendo água em frente a uma estação de ônibus, Manuel Riera, 44, também narra um clima de pânico nos olhos dos passageiros, com medo de assaltos, sequestros ou bombas. “Agora as pessoas estão voltando aos poucos. Ontem parecia que era pandemia ou um feriado de Carnaval”, diz.
O clima era mais tenso até a noite desta quarta. “Muito cuidado” era a recomendação de qualquer equatoriano à reportagem, e um taxista se recusava a circular pelas “zonas vermelhas”, mais perigosas, imprimindo as credenciais da repórter com medo de ser parado pela polícia a caminho do aeroporto.
A partir das 23h começa o toque de recolher, que durará dois meses em todo o país, e as cidades ficam desertas até as 5h.