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Voto é sobrevivência, e sobrevivência não é uma escolha – 27/12/2023 – Charles M. Blow

O autoritarismo está em ascensão, e a democracia está em declínio. Um relatório de 2022 do Instituto Internacional para a Democracia e Assistência Eleitoral constatou que “nos últimos seis anos, o número de países caminhando em direção ao autoritarismo é mais que o dobro do número caminhando em direção à democracia” e que quase metade dos 173 países avaliados estava “experimentando declínios” em pelo menos uma métrica da democracia.

Os Estados Unidos não estavam imunes a essa tendência. O relatório constatou que o país estava “retrocedendo moderadamente” em sua democracia.

Mas temo que agora estejamos à beira de nos afastarmos completamente da democracia e abraçarmos plenamente o autoritarismo. O país parece sedento por isso; muitos americanos parecem estar convidando-o.

A confiança em muitas de nossas principais instituições está no seu ponto mais baixo ou próximo disso nos últimos 50 anos, em parte por causa do projeto de direita liderado por Donald Trump para deprimi-la.

De acordo com um relatório da Gallup de julho, a confiança dos republicanos em 10 das 16 instituições medidas era menor do que a dos democratas. Três instituições em que a confiança dos republicanos superou a dos democratas foram a Suprema Corte, a religião organizada e a polícia.

E à medida que as pessoas perdem a fé nessas instituições, muitas das quais são fundamentais para manter o contrato social que as democracias oferecem, elas podem perder a fé na própria democracia.

As pessoas então perdem o medo de um candidato como Trump quando acreditam que a democracia já está quebrada. O mesmo Trump que tentou reverter a eleição presidencial anterior e recentemente disse que, se for eleito de novo, não será um ditador, “exceto no Dia 1”.

Na verdade, alguns recebem bem a perspectiva de quebrar a democracia e começar de novo com algo diferente, possivelmente uma versão do nosso sistema político de uma época em que ele era menos democrático —antes de expandirmos o grupo de participantes.

No novo livro de Tim Alberta, “The Kingdom, the Power and the Glory” (o reino, o poder e a glória), ele explica que muitos cristãos evangélicos desenvolveram, nas palavras de Robert Jeffress, pastor batista de direita, do Sul dos EUA, uma mentalidade de “sitiados” que lhes permitiu abraçar Trump, cujo currículo decadente vai contra muitos de seus valores declarados. Isso lhes permite usar Trump como músculo em sua batalha contra uma América em mudança.

Esse tipo de pensamento concede licença —ou fecha os olhos— para os impulsos autoritários de Trump.

E embora essas inclinações autoritárias possam ser mais visíveis na direita política, elas também podem se infiltrar na esquerda.

Você também poderia argumentar que o presidente Joe Biden, cujos índices de aprovação estão estagnados, está sendo punido por alguns porque ele não é autoritário e, portanto, não consegue governar por decreto. Muitas de suas iniciativas —proteções ao eleitorado, reforma policial, perdão de empréstimos estudantis— foram bloqueadas pelos conservadores.

Ele poderia ter lutado mais duramente em alguns desses casos? Eu acredito que sim. Mas, no final, a legislação é da competência do Congresso; os presidentes estão limitados por restrições constitucionais.

Certamente, Trump atrai aqueles que desejam um presidente que simplesmente derrube essa burocracia, ou pelo menos expresse desprezo por ela e esteja disposto a ameaçá-la.

Além disso, as chances de Trump provavelmente terão ajuda da parcela do eleitorado que subestima a utilidade do próprio voto. Ainda há muitos cidadãos que consideram o voto, especialmente para presidente, como algo para dar a uma pessoa de quem gostam, em vez de serem lançados para o candidato e partido mais propensos a avançar nas políticas de que precisam.

E há muitos que pensam que um voto deve ser retido de um candidato mais preferível como punição por não cumprir cada item de sua lista de desejos, que escolher não votar é um ato sensato de protesto político, em vez de uma renúncia ao controle para os outros. Abster-se de votar não empodera; castra.

Se você quer que uma democracia prospere, a ideia de que o voto é uma escolha é em si uma ilusão. Voto é sobrevivência, e sobrevivência não é uma escolha. É um imperativo. É um instinto.

É uma ferramenta que você usa para avançar e preservar a si mesmo. É um instrumento que você usa para diminuir as chances de dano e aumentar as chances de melhoria. É ingênuo usá-lo apenas para endossar o caráter de um indivíduo; não que o caráter não importe —importa— mas sim que sua primazia é uma falácia.

Votar não é apenas uma expressão de sua visão de mundo, mas também uma manifestação de sua insistência em segurança e proteção.

E para completar, como o deputado Ro Khanna, democrata da Califórnia, disse-me, a coalizão de Obama da qual Biden vai depender em 2024 está “sob muita pressão” com a questão da guerra Israel-Hamas. Segundo ele, essa coalizão pode ser reparada por “uma política externa baseada no reconhecimento dos direitos humanos”, que inclui “levar a sério os apelos por um cessar-fogo neutro e o fim da violência”.

Biden alertou que Israel corre o risco de perder o apoio internacional devido aos “bombardeios indiscriminados”, mas ainda não endossou um cessar-fogo.

Com os republicanos sinalizando autoritarismo e sem uma coalizão intacta para impedir isso, nossa democracia está por um fio.


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Fonte: Folha de São Paulo

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