O maior desastre ambiental urbano em curso no país, que completou cinco anos em março de 2023, atinge uma área equivalente a 20% do território de Maceió fez com que cerca de 60 mil pessoas tivessem que deixar suas casas na capital alagoana. Os primeiros tremores de terra registrados em março de 2018, que causaram rachaduras e afundamentos do solo em ruas, são o marco inicial do desastre que tem como causa as atividades de mineração da Braskem no município.
Novos tremores de terra foram registrados na manhã deste sábado (2) diante do iminente colapso de 1 das 35 minas de exploração de sal-gema de Braskem. A região passou a ser monitorada devido aos novos abalos sísmicos nesta semana que gerou risco iminente do colapso.*
A velocidade de afundamento do solo da mina, que fica no bairro do Mutange, caiu nos últimos dias. Ao todo, o solo da mina afundou 1,69 m desde o início do monitoramento, em 28 de novembro, até este domingo (3), de acordo com a Defesa Civil do município. O Ministério de Minas e Energia afirmou, em relatório divulgado neste domingo (3), que o afundamento da mina está estabilizado e que eventual desabamento será localizado, e não generalizado. Entenda em cinco pontos a crise ambiental em Maceió.
1) QUANDO COMEÇOU O DESASTRE AMBIENTAL EM MACEIÓ? Os primeiros danos visíveis no solo em Maceió foram registrados após tremores de terra atingirem a capital alagoana no dia 3 de março de 2018. O abalo sísmico foi de 2,4 pontos na escala Richter. As rachaduras em imóveis do bairro vinham sendo constatadas há pelo menos uma década, mas a situação agravou-se acentuadamente nos últimos anos. Os tremores causaram afundamentos de terra, erosões, rachaduras, fendas e trincas em casas, prédios e até mesmo o asfalto das ruas. Os danos atingiram 14,5 mil casas, apartamentos e estabelecimentos comerciais nos bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e Farol.
2) O QUE MOTIVOU OS TREMORES E AFUNDAMENTOS DO SOLO? O Serviço Geológico do Brasil, órgão ligado ao Ministério das Minas e Energia, concluiu em 2019 que as atividades de mineração da Braskem em uma área de falha geológica causaram o problema. No laudo, cientistas afirmam que o tremor de terra de 2018 aconteceu em razão do desmoronamento de uma dessas minas. Segundo o estudo, aquele não foi o único tremor, pois os laudos apontam a existência de outras minas deformadas e desmoronadas.
Até então, havia em área urbana 35 poços de extração de sal-gema, material usado para produzir PVC e soda cáustica. Os poços estavam pressurizados e vedados, porém a instabilidade das crateras causou danos ao solo, que foram visíveis na superfície. A exploração do minério começou em 1979 e se manteve até maio de 2019, quando foi suspensa pela mineradora Braskem um dia após a divulgação do laudo pelo Serviço Geológico. Os poços da Braskem são tubos que alcançam diretamente a camada de sal, entre 900 e 1.200 m de profundidade. Por meio deles, uma água com forte pressão e temperatura elevada é expelida para dissolver o sal. A água com sal é empurrada até a superfície, onde é extraída. O processo de dissolução do sal deixa buracos como galerias na rocha.
3) O QUE ACONTECEU APÓS OS PRIMEIROS TREMORES? A maioria das famílias que vivia nos bairros atingidos deixou suas casas frente ao risco de novos desabamentos. Lojas, estabelecimentos comerciais de serviços e até mesmo hospitais foram relocados. Os imóveis desvalorizaram. Um acordo firmado em janeiro de 2020 entre a Braskem e a força-tarefa formada pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual e Defensorias Estadual e da União determinou a indenização dos proprietários de 14,5 mil residências. A Braskem também ficou responsável pela estabilização e monitoramento do fenômeno geológico. A Braskem informou que 100% dos moradores das áreas de desocupação definidas pela Defesa Civil já foram realocados. O Movimento Unificado das Vítimas da Braskem alega que faltou celeridade nos pagamentos de indenizações e que, em muitos casos, o valor não foi justo.
Além dos moradores dos cinco bairros atingidos, pessoas que vivem em bairros do entorno também foram afetadas com dificuldade de acesso a serviços públicos e êxodo de comerciantes. Vários deles deixaram seus imóveis, mas não conseguem vendê-los diante da desvalorização. Nos cálculos do Movimento Unificado das Vítimas da Braskem, são cerca de 4.000 famílias vivem nessas áreas.
Em julho deste ano, Braskem e Maceió firmaram um acordo para o pagamento de uma indenização no valor de R$ 1,7 bilhão ao município. O governo do estado, por sua vez, não firmou acordo com a mineradora.
4) O QUE CAUSOU NOVO ALERTA? A Defesa Civil de Maceió alertou a última quarta-feira (29) que uma das minas da Braskem está em risco iminente de colapso. A população que mora próxima a área atingida, no bairro do Mutange, foi orientada a deixar o local e procurar abrigo. A situação fez a prefeitura decretar estado de emergência por um período de 180 dias. O poder público adotou medidas de emergência, incluindo a preparação de abrigos para as famílias realocadas, além de leitos em unidades de saúde, equipes de limpeza urbana e distribuição de cestas básicas. A Braskem disse que paralisou as atividades na área de resguardo “em decorrência do registro de microssismos e movimentações de solo atípicas pelo sistema de monitoramento.”
A velocidade de afundamento do solo da mina, que fica no bairro do Mutange, diminuiu ao longo das últimas 24 horas. De acordo com a prefeitura de Maceió, a velocidade de afundamento do solo caiu de 5 para 0,7 centímetros por hora, cenário que fez postergar o provável colapso da mina. Ao todo, o solo da mina da Braskem em Mutange afundou 1,69 m desde o início do monitoramento, em 28 de novembro, até este domingo (3), de acordo com a Defesa Civil do município. Professor aposentado da Universidade Federal de Alagoas, o engenheiro Abel Galindo afirma que o desabamento não deve acontecer de forma abrupta e que, por isso, não há motivo para pânico entre os moradores da capital alagoana.
5) QUANDO O SOLO DE MACEIÓ DEVE ESTABILIZAR EM DEFINITIVO? A atividade de mineração deixou um rastro de impactos geológicos e ambientais que ainda estão em curso. Não estão descartados novos tremores e afundamentos no futuro. Este cenário deve criar uma região fantasma na cidade, avalia o geólogo Pedro Cortês, professor da USP (Universidade de São Paulo). Ele afirma que o local afetado dificilmente será utilizado no futuro. A gravidade da situação, aponta Cortês, é explicada pelo fato de o minério da região ser altamente solúvel, ao mesmo tempo em que há água dos dois lados: de um, uma lagoa, e do outro, o oceano Atlântico. O Ministério Público Federal aponta que os impactos ambientais, assim como os sociais, são inexprimíveis. Não há ainda estabilidade no fenômeno geológico, o que significa que os danos não cessaram.