Nesta sexta (1º), o deputado George Santos pode se tornar o primeiro membro do Congresso americano em 20 anos a ter o mandato cassado. Em toda a história dos EUA, apenas seis políticos foram expulsos da Casa: três no século 19 por terem apoiado os confederados durante a Guerra Civil, e dois desde os anos 1980 após serem condenados pela Justiça por corrupção.
Caso a expulsão se confirme, Santos será o primeiro republicano a perder o mandato, e o único em que a decisão do Congresso ocorreu mesmo antes de uma condenação na Justiça.
Desde que reportagens apontaram uma série de inconsistências na biografia de Santos, desde alegações de que seus avós sobreviveram ao Holocausto a uma suposta carreira em Wall Street iniciada após a conclusão de uma faculdade que afirma não ter registro dele como aluno, o político se tornou motivo de piada nos EUA.
Uma investigação pelo Departamento de Justiça encontrou evidências mais graves contra o político, que resultou em 23 acusações criminais, de lavagem de dinheiro a roubo de identidade. O julgamento está marcado para setembro de 2024.
Há duas semanas, o Comitê de Ética da Câmara divulgou um levantamento próprio, que encontrou evidências de que Santos desviou recursos de campanha para comprar itens de luxo, pagar viagens e até bancar gastos no site de conteúdo erótico OnlyFans.
O deputado nega irregularidades e afirma ser vítima de perseguição. Falando a jornalistas na manhã desta quinta em frente ao Capitólio, ele disse ser alvo de “bullying”.
“Agora, se a Câmara deseja estabelecer um precedente diferente e me expulsar, isso será a ruína de muitos membros deste órgão, porque isso os perseguirá no futuro, onde meras alegações serão suficientes para remover membros do cargo quando devidamente eleitos pelo seu povo em seus estados e distritos respectivos”, afirmou.
Ao final da coletiva, uma repórter questionou se Santos estava vestindo algo comprado com dinheiro do seu fundo de campanha, apontando para o par de sapatos Ferragamo. “Não, nada. Esses sapatos têm seis anos”, respondeu.
Em seguida, o fundador do portal Punchbowl, Jake Sherman, provocou em sua conta no X: “Eu aposto que alguém por aí vai conseguir dizer se esse modelo de calçado estava à venda há seis anos!”
A CNN, por sua vez, levou ao ar um segmento praticamente de humor em que a visão positiva sobre o deputado, em 7%, segundo uma pesquisa do início do ano, era comparada com o percentual de americanos que acreditam em teorias da conspiração. A conclusão: há mais pessoas que acreditam que a Terra é plana e que os EUA fabricaram a chegada na Lua do que gostam de George Santos.
A votação desta sexta será a terceira tentativa de cassar o mandato do político. A primeira, em maio, foi protocolada por democratas e não teve apoio dos republicanos. A segunda, em 1º de novembro, foi uma iniciativa de colegas de partido de Nova York, e fracassou por falta de votos do restante da bancada, que afirmaram preferir esperar a conclusão da investigação do Comitê de Ética.
A divulgação do relatório, um dia após Santos se reunir com uma comitiva de congressistas bolsonaristas do Brasil, gerou uma enorme repercussão e levou membros dos dois partidos a protocolarem dois novos pedidos de cassação, um de cada lado.
Como republicanos, que são maioria na Câmara, rejeitam expulsar um membro do seu próprio partido por meio de uma iniciativa dos democratas, a única resolução com chance de ser aprovada é a apresentada por Michael Guest, presidente do Comitê de Ética.
A expulsão, no entanto, ainda é incerta, diante da resistência de muitos deputados a apoiarem a expulsão –entre eles o presidente da Câmara, Mike Johnson. “Pessoalmente, eu tenho muitas reservas sobre fazer isso. Estou preocupado com o precedente que pode ser criado”, afirmou.
Em reunião de bancada nesta semana, Johnson liberou os republicanos a votarem como preferirem –não houve uma orientação seja para condenar ou salvar o colega de partido. O presidente da Câmara disse ainda que conversou com Santos sobre a possibilidade de renunciar ao mandato, em vez de enfrentar a votação, mas a ideia foi rejeitada.
Para expulsar um membro, dois terços dos presentes devem apoiar a medida. Assumindo um quórum total de 435 deputados, isso significa 290 votos favoráveis à cassação. Se todos os 213 democratas apoiarem a medida, ainda serão necessários ao menos 77 votos republicanos.
Um levantamento feito pelo site Politico apontou que ao menos 90 colegas de partido de Santos sinalizaram serem favoráveis à expulsão. “Eu já fiz e refiz as contas, e o resultado não parece bom”, afirmou o próprio deputado em uma conversa virtual na semana passada.
Se a cassação for aprovada, Santos perde o mandato e a governadora de Nova York, Kathy Hochul, tem dez dias para convocar uma eleição especial para substituí-lo. A partir de então, o pleito deve ocorrer em 70 a 80 dias.
Para democratas, a nova eleição é a chance de ganhar de volta a vaga. O antigo representante do distrito, Tom Suozzi, já anunciou que deve concorrer. Do lado republicano, os nomes que sinalizaram interesse são Kellan Curry, Greg Hach e Mike Sapraicone.
No Brasil, Santos fez um acordo com o Ministério Público do Rio de Janeiro em um processo de estelionato. Ele confessou o uso de cheques sem fundos que haviam sido furtados de um idoso e fez um acordo para extinguir o processo, concordando com o pagamento de R$ 10 mil a uma instituição de caridade e R$ 14 mil à vítima, o dono de uma loja de sapatos.