O posto na Casa Rosada está garantido. Mas não será tão simples para Javier Milei, eleito neste domingo (19) o próximo presidente da Argentina com 55,69% dos votos válidos com 99,26% das urnas apuradas, tirar do papel suas propostas ambiciosas —uma lista que inclui uma abertura unilateral “à chilena” ao mercado global, sair do Mercosul e passar uma “motosserra”, palavras dele, na máquina estatal.
Um de seus maiores desafios será lidar com o Congresso, que saiu profundamente fragmentado do pleito de outubro, quando foram renovados cerca de metade da Câmara e um terço do Senado.
É verdade que a coalizão do ultraliberal, A Liberdade Avança, foi uma das que mais conquistou cadeiras na ocasião. Foi de 3 deputados —sendo dois deles, Milei e sua vice, Victoria Villarroel— para 38 e de nenhum senador para 7, alcançando com isso o título de terceira maior força política do país.
O apoio de Patricia Bullrich, pupila do ex-presidente Mauricio Macri e sua rival no primeiro turno, também o beneficiará. Mesmo tendo perdido cadeiras em outubro, a coalizão Juntos pela Mudança conta hoje com 93 deputados e 24 senadores.
Ainda assim, as cadeiras com que pode contar são poucas frente o total de 257 deputados e 72 senadores que compõem o Legislativo argentino. O grupo do presidente não tem nem o terço do Legislativo necessário para derrubar, por exemplo, um eventual impeachment.
Enquanto isso, a aliança peronista segue como principal força política, embora também não tenha maioria, com 108 deputados e 35 senadores. Na Câmara, o chamado “quórum mínimo” é de 129 cadeiras, e no Senado, de 37.
A inexperiência de Milei e de seus correligionários no poder é outro fator que pode pesar na hora de costurar acordos. Parte da popularidade do presidente eleito tem origem justamente no seu posicionamento “anticasta” política.
É um argumento genuíno —o economista não tinha participado nem sequer de grêmios estudantis quando, em 2021, aos 51 anos, candidatou-se a deputado federal em Buenos Aires e ganhou. Fazendo jus a sua descrição de si mesmo como um “anarcocapitalista”, sua atuação na Câmara é mínima, e ele sorteia de tempos em tempos o salário que ganha como parlamentar.
Mas a oposição normalmente têm menos responsabilidade do que o governo no Legislativo, e muitas vezes apresenta projetos apenas para demarcar sua agenda. Agora, Milei e seu A Liberdade Avança precisarão fazer concessões.
E isso, por si só, deve se mostrar um desafio e tanto. Afinal, tanto o candidato quanto o partido criado à sua imagem e semelhança são conhecidos e, mais, amados justamente por seu radicalismo e heterodoxia. Mesmo que depois do primeiro turno Milei viesse moderando seu discurso, riscando do vocabulário por exemplo a palavra “motosserra”.
Tanto os eleitos do Executivo quanto do Congresso tomam posse em 10 de dezembro.