Os incidentes de xenofobia em Portugal, como o ocorrido no Aeroporto do Porto, onde uma cidadã brasileira foi assaltada verbalmente por uma mulher portuguesa, são um sinal importante de que há muito trabalho por fazer no processo de acolhimento dos imigrantes brasileiros.
Residente na Europa há mais de sete anos, a cidadã foi confrontada publicamente com palavras insultuosas, carregadas de estereótipos e preconceitos que não podem ficar impunes. A República portuguesa tem de mostrar-se diligente e, perante as evidências, considerar público o crime e fazer dele uma bandeira.
Não sendo um episódio isolado, porque sempre existem tensões em espaços onde culturas se cruzam, é importante reforçar que a esmagadora maioria dos lusos é tempestiva e acolhedora. Por isso, deixar passar em claro este abuso com potencial para contaminar a imagem coletiva do país luso não deve ser tolerado.
Mas é também imperativo que, em face dessas expressões de xenofobia, não apenas condenemos esses atos, como também nos voltemos para a cultura como alicerce de uma sociedade mais inclusiva.
A cultura, em todas as suas manifestações —seja na literatura, que explora as nuances da condição humana; no cinema, que nos permite viver vidas diferentes da nossa; ou na música, que toca universos emocionais compartilhados— é o único antídoto contra a ignorância que alimenta o preconceito.
Investir em políticas culturais tem de ser mais que um país importar novelas e bossa nova e outro exportar fado e técnicos de futebol. É preciso educar, abrir caminhos para a empatia e criar espaços onde o “outro” não seja uma ameaça, mas sim um convite para a expansão do nosso próprio mundo.
O investimento dos Estados em educação e políticas culturais robustas é fundamental para que incidentes como o do aeroporto da cidade do Porto se tornem relíquias de um passado menos iluminado que ainda persiste em Portugal, quase 50 anos passados da independência dos países lusófonos de África.
A xenofobia é uma mancha na tela da nossa coletividade, e a cultura, o pincel que pode redefini-la. É essencial um apelo às autoridades luso-brasileiras para que a partilha cultural seja elevada a uma responsabilidade bilateral, transcendendo os habituais discursos de circunstância.
Também é importante que os homens públicos não alimentem polêmicas desnecessárias. Nenhum político contribui para um futuro melhor entrando nessa jogada. As centenas de milhares de brasileiras e brasileiros que escolheram Portugal como sua casa não podem ficar expostas a tibiezas por parte da Justiça portuguesa, mas os políticos têm de ser responsáveis com as palavras que utilizam. Discursos inflamados podem deitar muito a perder. Pedir o ouro de volta não ajuda os 600 mil brasileiros que moram em Portugal.
Este não é só um problema de xenofobia, é sobretudo um problema de justiça. A minoria ruidosa que erra não pode contaminar a maioria silenciosa que acerta. Assim como a parte não pode prejudicar o todo, o passado longínquo não deve comprometer o futuro imediato.
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