Uma multidão acompanhou o voto do ultraliberal Javier Milei na Argentina neste domingo (22), que teve empurra-empurra, pessoas passando mal e bate-boca com jornalistas, além de cantos de torcida e “Parabéns para você”. O presidenciável completa 53 anos no mesmo dia em que pode, eventualmente, se tornar presidente.
Ele chegou de carro por volta das 13h na Universidade Tecnológica Nacional, no bairro de Almagro em Buenos Aires, onde um grupo de apoiadores e jornalistas o esperavam há mais de uma hora, quase todos com celulares em mãos.
A confusão se acentuou quando ele desceu do veículo, ao lado da irmã Karina Milei e próximo a jovens influenciadores que costumam cobrir sua campanha. Quase sem conseguir caminhar, ele chegou a tropeçar na escada de entrada. Estava prevista uma entrevista coletiva organizada, o que acabou não acontecendo.
Na multidão, uma adolescente se perdeu da mãe e passou mal, tremendo e chorando, mas se acalmou minutos depois. Próximo dali, ao lado de policiais que tentavam controlar a situação, duas mulheres idosas se empurraram e trocaram ofensas por falta de espaço.
Mais adiante, um apoiador de Milei e uma jornalista também discutiram. “Não mudem tudo [que Milei diz]. Informação, e não pagamentos”, gritava ele, incentivado por dois ou três homens. “Não sei de quem você está falando”, rebatia ela, sendo separada por colegas.
Em outros colégios eleitorais, porém, a votação se dá de forma tranquila e com menos tensão do que nas eleições primárias de agosto. Naquela ocasião, uma regra que impôs o voto eletrônico para candidatos ao governo da cidade de Buenos Aires causou longas filas e brigas em diversos locais.
Em uma escola pública no bairro de Belgrano em Buenos Aires, o zelador Roberto Verón, 58, pedia união. “Só quero o país tenha um pouco de unidade, sou cristão. Se estamos sempre brigando não podemos seguir adiante”, disse ele, que não quis declarar seu voto.
Assim como muitos argentinos, ele foi às urnas sem saber o que vai acontecer com suas economias em pesos nesta segunda (23). “Estamos todos esperando. Eu não compro dólares, e minha filha quer ir à faculdade no ano que vem estudar administração de empresas. Então estamos tentando guardar, mas não sei se vai dar.”
O clima no país vizinho é de profunda incerteza diante de uma eleição que pode mudar drasticamente, ou não, o dia a dia da população. O pleito ocorre depois de meses de uma aflitiva espera vendo o dólar e os preços subirem, enquanto o governo tenta segurar as pontas até que se defina quem será presidente a partir de 10 de dezembro, no lugar do ausente Alberto Fernández.
O temor, quase uma certeza, é de que o dólar dispare com a divulgação dos resultados, num país em que os preços sobem junto com a moeda americana —movimento que é comum pré-eleições, mas se intensificou agora. “Antes viajávamos, e não estou nem falando de Europa, mas dentro do nosso país. Aqui a 300 km, não se pode mais ir”, conta Roberto.
A desilusão com a situação atual faz uma parte dos eleitores se inclinarem a Milei, que promete dolarizar a economia, fechar o Banco Central e cortar radicalmente os gastos públicos. É o caso do representante comercial Julio González, 56. “O que as pessoas pensam é: já me ferraram todos, que venha um diferente”, afirma.
Ele enfatiza que é de direita, não extrema-direita, “mas para mim qualquer um dos dois [Milei ou a macrista Patrícia Bullrich, em terceiro lugar nas pesquisas] é melhor que [o ministro da Economia e peronista Sergio] Massa”, diz. “Está muito complicado de escolher, mas estamos acostumados a isso”, adiciona.
Já a estudante Sol Pisetta, 23, que trabalha como passeadora de cachorros e é fiscal eleitoral da aliança União pela Pátria de Massa, acredita que as pessoas estejam votando em Milei apenas por raiva e por nunca ter ocupado um cargo Executivo (ele é deputado desde 2021), mas não por suas propostas.
“Estive nas ruas falando com as pessoas, distribuindo panfletos. Muita gente diz que vai votar no milei, mas quando você diz que ele vai tirar o 13º salário, os benefícios sociais das pessoas, dizem ‘ah é?’, ou seja, não sabem direito em quem estão votando”, diz ela. “Muita gente acha que o salário que tem em pesos será automaticamente transformado em dólares, e não que vai diminuir muito quando for convertido.”
Ela diz preferir que os argentinos votem em Bullrich, o que se espera que ocorra principalmente na capital, onde a rejeição ao kirchnerismo é visível. “Agora precisamos que os votos se dividam um pouco mais, para que haja segundo turno [em 19 de novembro]”, explica, apostando que Milei não terá apoio no Congresso para reformas muito radicais. “Ele não pode governar por decreto”.
Além do presidente, os mais de 35 milhões de eleitores argentinos elegerão neste domingo metade da Câmara de Deputados, um terço do Senado e alguns governadores importantes, como o da província e o da cidade de Buenos Aires. O voto é obrigatório para quem tem de 18 a 70 anos, e facultativo para quem tem entre 16 e 18.
A votação acontece até as 18h e a divulgação dos resultados está prevista a partir de 22h. Haverá segundo turno se nenhum dos candidatos conseguir 45% dos votos válidos ou 40% e mais 10 pontos percentuais de diferença para o segundo colocado.