Um dos paradoxos da eleição presidencial dos Estados Unidos é que um dos candidatos, cujo ponto forte entre os eleitores é a economia, pensa que esse não é o tema principal da eleição. Pela primeira vez, em um ato eleitoral, Trump falou em voz alta o que vinha dizendo a seus principais assessores, que a imigração é o principal tema, “supera a economia”. Mas não foi só isso, Trump afirmou que “Estados Unidos são agora um país ocupado. Mas 5 de novembro de 2024 será o dia da libertação nos Estados Unidos”.
País ocupado? Libertação? Essas ideias conspiratórias e apocalípticas nos lembram as das ditaduras latino-americanas. E, voltando um pouco mais, aos discursos fascistas, como os de Adolf Hitler e Benito Mussolini.
Se Pinochet escreveu um livro sobre liberdade enquanto a destruía por completo em seu país, demonizando e assassinando opositores, Trump promete deportações em massa e uma ditadura efêmera para o primeiro dia de seu governo: “a ditadura do dia 1”. E como se não bastasse, o ex-presidente afirma que os imigrantes não devem ser considerados pessoas e que poluem o ser nacional, pois “envenenam o sangue de nosso país”, algo que lembra as palavras de Hitler em seu livro “Mein Kampf”: “Todas as grandes culturas do passado pereceram porque as raças originalmente criativas se extinguiram pelo envenenamento do sangue”.
A relação entre crime e desumanização, explorada por líderes como Bolsonaro no Brasil e Bukele em El Salvador, faz parte de uma ideologia extremista que a precede. A violência extrajudicial é apresentada como uma solução absoluta para os problemas das pessoas. E, nesse marco, a economia e a desigualdade ficam em segundo plano, enquanto a política de entendimento e o diálogo democrático desaparecem por completo.
Muitos especialistas se perguntam como Trump, caso ganhe a eleição, mudará o sistema político, já que a democracia estadunidense tem um sistema complexo de freios e contrapesos legais e sociais. No entanto, os planos autoritários estão até no papel. Em particular, devemos nos lembrar do Projeto 2025 da Heritage Foundation, prefaciado por seu candidato a vice-presidente, J.D. Vance.
Uma das ideias é recategorizar uma infinidade de funcionários públicos como nomeados políticos e substituí-los por trumpistas. Ou seja, propõe a erosão das diferenças entre as instituições, o líder e a constituição de um Estado que estaria absolutamente sujeito aos seus caprichos.
A preocupação com uma possível vitória de Trump e sua relação com o fascismo apareceu recentemente na capa do The New York Times. Até mesmo a candidata democrata Kamala Harris afirma que a opção que Trump representa pode ser considerada fascista.
Trump é “fascista em sua essência”, disse o general aposentado Mark Milley. O ex-chefe do Estado-Maior Conjunto acrescentou que Trump é “a pessoa mais perigosa para este país”. O antigo chefe de gabinete de Trump, general reformado John Kelly, também disse que com base na sua experiência com Trump, o antigo presidente enquadra-se “na definição geral de fascista, sem dúvida”.
As declarações de Milley e Kelly confirmaram o que muitos pensam. A política de Trump baseada no ódio, nas mentiras, na idealização da violência e da repressão e nas aspirações ditatoriais é demasiado semelhante às formas clássicas de fascismo.
Nesse sentido, a negativa de Trump sobre aceitar o veredito do sistema democrático após perder as eleições de 2020 combina seus impulsos antidemocráticos com temores pessoais, a mesma combinação que marcou os totalitários e fascistas por décadas. O ex e quiçá futuro presidente segue o manual de Hitler ao projetar sobre seus inimigos todos seus ódios, fantasias e aspirações.
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