As Forças de Defesa de Israel estão preparando uma ofensiva terrestre contra o Hezbollah no sul do Líbano e preveem que poderão empreender uma “luta mais feroz” do que a que travam na Faixa de Gaza desde que o Hamas palestino lançou o ataque terrorista de 7 de outubro de 2023.
O relato foi feito de forma reservada à Folha e a outro veículo por um militar envolvido na operação na noite desta terça-feira (24).
Segundo ele, as forças estão prontas para emprego, caso a campanha para degradar as capacidades do Hezbollah e empurrar o grupo libanês para norte da linha acordada em 2000 com a ONU, na altura do rio Litani, não dê certo pelo ar.
Até aqui, a ação iniciada na semana passada destruiu “milhares de foguetes”, segundo o oficial. O chefe da força de mísseis do Hezbollah foi morto nesta terça, e a cúpula da unidade criada para se infiltrar no norte de Israel, na sexta-feira (20).
Mas o fardado admite que isso pode não ser suficiente. Até o início da atual campanha, diz, o Hezbollah era um “time profissional” comparado com o Hamas. Ele lembrou que os libaneses lutaram ao lado da ditadura de Bashar al-Assad e de forças iranianas na guerra civil da Síria.
Além disso, comandam um formidável arsenal estimado em 160 mil mísseis e foguetes, mais do que a maioria dos países do mundo. Essa força começou a ser alvejada diretamente agora, mas não necessariamente será destruída por completo —até aqui, a ordem é tirar o Hezbollah das fronteiras.
A consideração sobre uma guerra regional maior, envolvendo Teerã, que financia tanto os libaneses quanto o Hamas, por ora não parecem pesar. Talvez seja o peso dos reforços de seus aliados americanos na região como elemento de dissuasão.
Enquanto as Forças Armadas avalia essa degradação, o esforço de guerra perdeu gás em Gaza. Das cinco divisões que chegaram a lutar no ápice do conflito na terra do Hamas, cada uma com mais de 10 mil homens, hoje há duas.
Os militares não revelam números, claro, mas a sugestão é de que boa parte das 11 divisões operacionais de Israel esteja se preparando para entrar novamente no Líbano. A memória é longa: em 1982, em meio à guerra civil do país árabe, Israel ocupou seu sul para caçar a liderança palestina em exílio.
Foi uma guerra difícil e suja, com associações amplamente condenadas com facções em luta, resultando em massacres. O Hezbollah nasceu naquele ano, bancada pelo Irã em campos de maioria xiita no sul libanês.
O fantasma de uma ocupação indesejada existe, dado que a resolução da ONU que regrou a retirada final de Israel em 2000 nunca foi totalmente implementada. A ideia é ter um tampão contra risco de invasões ao estilo do Hamas contra o norte israelense.
Ninguém sabe dizer quando uma força invasora deixa o campo de batalha, ainda que o militar preveja que tal situação forçaria um cessar-fogo. Ele não fala, contudo, sobre o cenário em que isso acontece com o Hezbollah mantendo capacidades de longo alcance contra Israel.
As lições do mais recente conflito aberto entre os rivais, um empate com gosto de vitória para o Hezbollah em 2006, são lembradas. Hoje os militares consideram que, à luz do difícil combate urbano em Gaza, que deixou segundo o Hamas mais de 41 mil mortos, será mais fácil operar no sul do Líbano e seus campos abertos.
O relato vem em linhas com as falas públicas das autoridades israelenses nesta terça. O presidente Isaac Herzog disse à rede CNN que não quer uma nova guerra e que seu país não tem interesse territorial no Líbano.
Por sua vez, o principal porta-voz das Forças Armadas, almirante Daniel Hagari, afirmou a repórteres que Israel está “lutando para que a campanha seja breve”, mas preparado “para que ela seja longa”.
Tudo isso soa como uma preparação da opinião pública acerca do tema. Desde que o Hamas atacou Israel, o Hezbollah passou a escalar as ações na fronteira. Cerca de 9.000 mísseis, foguetes e drones já foram lançados contra o país, a maioria na região norte, o que obrigou a saída de 60 mil moradores de lá.
Os fundamentalistas libaneses, principal grupo apoiado e armado pelo Irã na região, apoiam o Hamas, assim como seus patronos. Na semana passada, como havia dito à reportagem mais cedo o porta-voz militar Rafael Rozenshein, Israel “perdeu a paciência”.
Passou a atacar o Hezbollah por múltiplas frentes, inicialmente com o não assumido atentado com pagers e walkie-talkies transformados em bombas. Depois, houve a escalada em curso.