Os pagers que explodiram no Líbano e feriram milhares de pessoas nesta terça-feira (17) eram da marca Gold Apollo, uma fabricante de pagers de Taiwan. A empresa, porém, negou nesta quarta (18) ter produzido os dispositivos —segundo seu fundador, os equipamentos foram montados sob licença por uma empresa chamada BAC, com sede na capital da Hungria, Budapeste.
O ataque, que visava o Hezbollah, aumentou a perspectiva de uma guerra em grande escala entre o grupo fundamentalista e Israel, que não assumiu oficialmente a autoria da ofensiva. Pelo menos 12 pessoas morreram até agora, incluindo duas crianças, disse o ministro da Saúde do Líbano, Firass Abiad, nesta quarta. O ataque ainda feriu quase 3.000 pessoas, incluindo muitos membros do grupo e um enviado do Irã a Beirute.
De acordo com um funcionário do setor de segurança do Líbano, o grupo encomendou 5.000 pagers da Gold Apollo, que, segundo afirmaram varias fontes à agência de notícias Reuters, foram levados ao país no início deste ano.
O fundador da empresa, porém, disse que os pagers usados na explosão foram fabricados por uma empresa na Europa chamada BAC. “O produto não era nosso. Apenas tinha nossa marca nele”, disse Hsu Ching-Kuang a jornalistas em Nova Taipé, no norte de Taiwan, nesta quarta.
O endereço da BAC Consulting dá para um prédio pêssego em uma rua predominantemente residencial em um subúrbio em Budapeste. O nome da empresa estava escrito em uma folha A4 em uma porta de vidro.
Uma pessoa no prédio, que pediu para não ser identificada, disse que a BAC Consulting estava registrada ali, mas não tinha sede física. A presidente-executiva da BAC Consulting, Cristiana Barsony-Arcidiacono, diz em seu perfil no LinkedIn que trabalhou como consultora para várias organizações, incluindo a Unesco. Ela não respondeu aos emails da Reuters.
As atividades registradas da BAC são amplas —desde publicação de jogos de computador até consultoria de TI e extração de petróleo bruto.
Segundo o funcionário da área de segurança do Líbano, os pagers que explodiram eram do modelo AR-924. Os combatentes vinham usando o equipamento obsoleto na tentativa de evitar o rastreamento de Tel Aviv. Os dispositivos, no entanto, foram modificados pelo serviço de espionagem de Israel na etapa de produção, segundo ele.
O funcionário afirmou que a agência de inteligência de Israel, chamada de Mossad, injetou uma placa dentro do dispositivo que contém material explosivo e recebe um código. De acordo com ele, é muito difícil detectar a modificação. Funcionários israelenses não responderam imediatamente a pedidos de comentário da Reuters.
O funcionário libanês disse que cerca de 3.000 dos pagers explodiram quando uma mensagem codificada foi enviada a eles, ativando simultaneamente os explosivos. Outra fonte de segurança disse à Reuters que até 3 gramas de explosivos estavam escondidos nos novos pagers e passaram despercebidos pelo Hezbollah por meses.
Em um discurso televisionado no dia 13 de fevereiro, o secretário-geral do grupo, Hassan Nasrallah, advertiu os apoiadores de que seus telefones eram mais perigosos do que espiões israelenses, dizendo que deveriam quebrá-los, enterrá-los ou trancá-los em uma caixa de ferro.
Em vez disso, o Hezbollah optou por distribuir pagers para seus membros em vários ramos do grupo —desde combatentes até médicos que trabalham em seus serviços de socorro.
O ataque se junta a outras ações do tipo do Mossad. A agência ganhou notoriedade por suas operações após o sequestro do funcionário nazista de alto escalão Adolf Eichmann, em 1960. Mais recentemente, a agência de espionagem foi responsabilizada por ataques cibernéticos e pelo assassinato, em 2020, de um importante cientista iraniano com uma metralhadora controlada remotamente.
O Hezbollah, partido com braço paramilitar apoiado pelo Irã, prometeu retaliar Israel. Os dois lados estão envolvidos em combates na fronteira desde o início da guerra na Faixa de Gaza, em outubro do ano passado, o que alimenta temores de um conflito mais amplo no Oriente Médio que poderia envolver diretamente Estados Unidos e Irã.
“O Hezbollah quer evitar uma guerra total. Ainda quer evitar uma. Mas, dada a escala, o impacto nas famílias, nos civis, haverá pressão para uma resposta mais forte”, disse Mohanad Hage Ali, vice-diretor de pesquisa do Carnegie Middle East Center.