Em uma manhã recente no leste da Ucrânia, Karina Iatsina, uma trabalhadora de mina, estava ocupada operando uma correia transportadora em um túnel escuro de 366 metros de profundidade. As luzes piscavam no final do poço, iluminando os mineiros cavando as camadas de carvão.
Há um ano e meio, Karina, 21, trabalhava como babá. Então amigos lhe disseram que uma mina na cidade de Pavlohrad estava contratando mulheres para substituir homens convocados para o Exército ucraniano. O salário era bom, e a pensão, generosa. Não demorou muito para que ela estivesse caminhando pelos labirintos da mina, com uma lanterna presa ao seu capacete vermelho.
“Eu nunca teria pensado que estaria trabalhando em uma mina”, disse Karina, fazendo uma breve pausa no calor sufocante do túnel. “Eu nunca teria imaginado isso.”
Karina é uma das 130 mulheres que começaram a trabalhar no subsolo da mina desde o início da invasão da Ucrânia em fevereiro de 2022. Elas agora operam máquinas que levam o carvão para a superfície, trabalham como inspetoras de segurança ou dirigem os trens que conectam as diferentes partes da mina.
“A ajuda delas é enorme porque muitos homens foram lutar e não estão mais disponíveis”, disse Serhii Faraonov, vice-diretor da mina, administrada pela DTEK, a maior empresa de energia privada da Ucrânia. Cerca de mil trabalhadores homens da mina foram convocados, disse ele, ou cerca de um quinto da força de trabalho total. Para ajudar a compensar a escassez, foram contratadas cerca de 330 mulheres.
Elas fazem parte de uma tendência mais ampla na Ucrânia, onde as mulheres estão cada vez mais assumindo empregos há muito dominados por homens, à medida que a mobilização generalizada de soldados esgota a força de trabalho dominada por homens. Elas se tornaram motoristas de caminhão ou de ônibus, soldadoras em fábricas de aço e trabalhadoras de armazém. Milhares também se juntaram voluntariamente ao Exército.
Ao fazer isso, essas mulheres estão remodelando a força de trabalho tradicionalmente dominada por homens da Ucrânia, que os especialistas dizem ter sido marcada por preconceitos herdados da União Soviética. “Havia essa percepção de mulheres como trabalhadoras de segunda classe e menos confiáveis”, disse Hlib Vichlinski, diretor-executivo do Centro de Estratégia Econômica de Kiev.
Vichlinski disse que as mulheres ucranianas há muito tempo foram excluídas de certos empregos, não apenas devido às demandas físicas, mas também porque tais funções eram consideradas muito complicadas para elas. Mulheres, ele disse, poderiam dirigir ônibus elétricos, mas não trens. “Estava cheio de estereótipos.”
A atual entrada de mulheres no mercado de trabalho ucraniano tem ecos das chamadas munitionettes, britânicas que trabalharam em fábricas de armas durante a Primeira Guerra Mundial, e daquelas que foram trabalhar nos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial —imortalizadas nos icônicos cartazes Rosie the Riveter (Rosie, a Rebitadeira).
Mas mesmo com a entrada de mulheres na força de trabalho, elas não serão suficientes para substituir todos os trabalhadores homens que saíram, dizem os economistas. Três quartos dos empregadores ucranianos enfrentaram escassez de mão de obra, mostrou uma pesquisa recente.
Antes da guerra, 47% das mulheres ucranianas trabalhavam, de acordo com o Banco Mundial. Desde então, cerca de 1,5 milhão de trabalhadoras, 13% do total, deixaram a Ucrânia, disse Vichlinski.
O fenômeno das mulheres ingressando na força de trabalho tem sido particularmente evidente na indústria de mineração.
Após a invasão russa em 2022, o governo ucraniano suspendeu uma lei que proibia as mulheres de trabalhar no subsolo e em condições “nocivas ou perigosas”. Agora, elas são presença regular nos poços de elevadores apertados que levam os trabalhadores às profundezas das minas.
“Fiquei surpreso. É incomum ver uma mulher com uma pá fazendo o trabalho de um homem”, disse Dmitro Tobalov, um mineiro de 28 anos, logo após uma mulher passar por ele e por outros mineiros que estavam descansando em bancos em um túnel, esperando para embarcar no elevador de volta para fora da mina.
Tobalov, que trabalha em uma mina em Pokrovsk, na região oriental de Donetsk, disse que 12 homens deixaram seu grupo de mineiros para o Exército, substituídos por dez homens e duas mulheres. “Elas estão se saindo muito bem”, disse.
Várias mulheres disseram que se juntaram à mina de Pokrovsk, de propriedade da Metinvest, a maior produtora de aço da Ucrânia, porque oferecia empregos estáveis em uma economia devastada pela guerra.
Valentina Korotaeva, 30, ex-atendente em Pokrovsk, disse que perdeu o emprego depois que um míssil russo caiu perto da loja onde ela trabalhava, fazendo com que os proprietários empacotassem e fossem embora. Agora ela trabalha como operadora de guindaste na mina, movendo grandes máquinas de metal em reparo em um armazém.
Quanto tempo Valentina poderá manter seu emprego dependerá da situação na linha de frente, a apenas 13 quilômetros da mina. As forças russas têm se aproximado de Pokrovsk nas últimas semanas. A Rússia frequentemente bombardeia a área, e a administração da mina preparou planos de retirada caso se torne muito perigoso permanecer lá.
“É assustador”, disse Valentina, mãe de dois filhos. “Mas por enquanto estou ficando porque há escolas e jardins de infância aqui. Não há para onde ir.”
Várias mulheres disseram que trabalhar em uma mina era uma forma de participar do esforço de guerra, mantendo a economia ucraniana em funcionamento enquanto os homens lutam na linha de frente.
As minas de carvão têm sido uma tábua de salvação para muitas cidades no leste da Ucrânia, empregando dezenas de pessoas e contribuindo significativamente para o orçamento do governo por meio de impostos.
Empresas também têm tentado trazer mais mulheres para o mercado de trabalho por meio de programas de treinamento. A mina de Pokrovsk iniciou um programa no início deste ano que até agora permitiu que 32 mulheres trabalhassem no subsolo.
A Reskilling Ukraine, uma organização sem fins lucrativos sueca, ofereceu cursos de treinamento acelerado para mulheres que desejam se tornar motoristas de caminhão. Mais de mil mulheres se inscreveram este ano, mas a organização tem fundos para treinar apenas 350, disse Oleksandra Panasiuk, coordenadora do programa.
“Muitas mulheres queriam ser motoristas, mas, por muito tempo, a sociedade realmente não permitiu que elas fizessem isso”, disse Oleksandra. “Isso está mudando.”