O resgate de um refém pelo Exército israelense de um túnel na Faixa de Gaza na terça-feira (27) destacou um dos maiores obstáculos restantes para o objetivo do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu de erradicar o Hamas: a vasta e complicada rede subterrânea do território que abriga muitos dos líderes remanescentes da facção terrorista.
O Exército israelense disse que havia resgatado Qaid Farhan Alkadi —membro da minoria árabe beduína de Israel sequestrado em 7 de outubro de 2023— de um túnel do Hamas no sul de Gaza.
Segundo dois altos funcionários que falaram sob condição de anonimato porque não estavam autorizados a conversar com repórteres, as Forças Armadas israelenses parecem ter encontrado Alkadi por acaso enquanto vasculhavam uma rede de túneis em busca de combatentes do grupo terrorista.
Foi a segunda vez em duas semanas que a rede de túneis do Hamas foi destaque nos relatos de Israel sobre os esforços de recuperação de reféns, lançando alguma luz sobre um aspecto em grande parte invisível da guerra que é de grande importância para os militares e autoridades israelenses.
Na semana passada, tropas de Tel Aviv disseram ter recuperado os corpos de seis reféns escondidos atrás de revestimento de concreto em uma rota subterrânea conectada a um poço de 10 metros de profundidade.
Essas descobertas subterrâneas após quase 11 meses de guerra mostram o quão elaborada e extensa se revelou a rede de túneis do Hamas, dizem especialistas. Alguns deles têm centenas de quilômetros de extensão, segundo autoridades israelenses, o Hamas e os Estados Unidos.
“Os túneis são enormes”, diz Dan Byman, membro sênior do Programa de Guerra, Ameaças Irregulares e Terrorismo do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais em Washington. A guerra em Gaza revelou duas surpresas sobre o sistema subterrâneo que o Hamas construiu, acrescenta: há mais túneis e eles são mais sinuosos do que se acreditava anteriormente.
Byman explica que os túneis servem ao Hamas de várias maneiras. Não apenas o grupo pode esconder seus líderes e reféns neles, mas capturá-los é muito mais difícil do que tomar um prédio acima do solo. É nesse espaço subterrâneo que as Forças israelenses estão muito mais vulneráveis e precisam se mover muito lentamente.
“A vantagem do Exército de Israel é uma tremenda coordenação e consciência da situação, e nos túneis isso é muito mais difícil”, disse Byman.
Tentar destruir o sistema subterrâneo de cima também é problemático, disse o especialista, porque requer bombas grandes que causam muito dano e potencialmente colocam em risco a vida de reféns escondidos nos túneis. Ele sugeriu que muitos dos sequestrados que restaram estavam sendo mantidos no subsolo, talvez ao lado de líderes do Hamas, dado que “eles são um ativo muito valioso” e “uma das principais cartas de negociação do Hamas”.
O Exército israelense tentou várias táticas durante a guerra para forçar os combatentes do Hamas a saírem à superfície, incluindo inundar os túneis e selá-los. Eles também explodem regularmente as entradas dos túneis e enviam cães, drones e robôs para dentro deles para evitar arriscar a vida de um soldado.
“É horrível”, disse James Wirtz, professor de assuntos de segurança nacional na Escola de Pós-Graduação Naval. “Há curvas, salas laterais e armadilhas. É uma coisa difícil de pedir a um soldado para fazer.”
O Exército israelense disse que está progredindo na eliminação da infraestrutura subterrânea do Hamas. Em 15 de agosto, os militares afirmaram ter destruído cerca de 50 túneis em uma semana, e divulgou vídeo de soldados explodindo bunkers e materiais de construção em uma área ao longo da fronteira com o Egito que Israel chama de Corredor Filadélfia.
Garantir que esses túneis e outros não sejam reconstruídos tem sido uma questão crítica nas negociações de cessar-fogo mediadas entre Israel e o Hamas. Netanyahu quer que algumas tropas israelenses continuem patrulhando o Corredor Filadélfia para evitar que o Hamas se rearme após a guerra ou reconstrua túneis até o Egito.
Seu objetivo declarado é eliminar o Hamas, seus líderes e sua infraestrutura, uma missão que alguns na comunidade militar israelense sugeriram ser impossível. O Exército israelense disse neste mês que matou 17 mil membros do grupo terrorista na guerra, mas as tropas têm lutado repetidamente contra insurgências em áreas de Gaza que haviam sido anteriormente declaradas livres de combatentes do Hamas. E alguns dos principais líderes do grupo militante sobreviveram.
Em novembro, um refém israelense libertado descreveu como Yahya Sinwar, um líder do Hamas que agora é o chefe político do grupo, havia se dirigido a um grande número de cativos israelenses no subsolo logo após os ataques de 7 de outubro, dizendo que estavam seguros e que nenhum mal lhes aconteceria. Os Estados Unidos e Israel estavam trabalhando arduamente na época para encontrar e capturar Sinwar —e têm tentado desde então.
Em janeiro, soldados israelenses invadiram um complexo de túneis no sul de Gaza com base em informações de que Sinwar estava se escondendo lá. Mas ele havia deixado o bunker subterrâneo dias antes e continua foragido.